quinta-feira, 2 de setembro de 2010

"Instabilidade dos Laços Afetivos e Possíveis Repercussões na Vida Emocional da Criança"



Rosângele Monteiro
Psicóloga Perinatal

O objetivo deste artigo é apresentar elementos acerca do impacto da instabilidade dos laços afetivos na vida emocional da criança.
Como já deve ser de conhecimento, ainda que popular ou leigo, os vínculos afetivos desde a mais tenra infância constituem a base da vida emocional do ser humano. Quando ocorrem prejuízos, de qualquer natureza, na formação ou na manutenção desses vínculos, há uma possibilidade maior de ocorrências emocionais que levem a algum prejuízo do desenvolvimento saudável da criança. Estados depressivos, ou mesmo a própria depressão, ansiedade, agressividade, comportamentos anti-sociais e psicose, são algumas possibilidades de transtornos emocionais em crianças que vivenciaram uma instabilidade na formação, manutenção, ou mesmo no rompimento dos vínculos afetivos. Não há estudos comprovadamente conclusivos, pois são muitas as variações individuais na reação ao rompimento de um vínculo afetivo, mas as pesquisas acabam apontando alguma contribuição de separações e perdas vividas na infância a alguns distúrbios de comportamento.
Bowlby (1907) considera como sendo o núcleo do vínculo afetivo “a atração que um indivíduo sente por outro indivíduo”, e pressupõe que essa atração não ocorra em qualquer relação, há algum significado especial naquela relação para ambos.
No que diz respeito aos bebês, crianças de até três anos de idade, é através dos cuidados rotineiros que eles recebem e ao significado emocional da relação que estabelecem com seus cuidadores que poderão vivenciar um vínculo afetivo.
Winnicott (1993) refere-se à saúde mental como “um produto do cuidado contínuo que torna possível uma continuidade do crescimento emocional pessoal”.
Mas há um elemento que compõe a vinculação afetiva de maneira determinante - o seu prevalecimento. Assim, numa relação onde está estabelecido um vínculo de afeto, há uma necessidade básica de estar próximo do outro, um é referência afetiva para o outro, há um sentimento amoroso que o atrai para o outro. Dentro da diversidade de estabelecimento de vínculos possível para o ser humano, é o amor que diferencia o vínculo entre mãe e filho, por exemplo. E mãe poderá ser qualquer pessoa com quem a criança estabeleça esse tipo de vínculo.
“Em termos de experiência subjetiva, a formação de um vínculo é descrita como “apaixonar-se”, a manutenção de um vínculo como “amar alguém”, e a perda de um parceiro como “sofrer por alguém”. Analogamente, a ameaça de perda gera ansiedade e a perda real causa tristeza; ao passo que ambas as situações podem despertar raiva” (Bowlby 1907). Ainda segundo este autor “a manutenção incontestada de um vínculo é experimentada como fonte de segurança, e a renovação de um vínculo como uma fonte de júbilo”.
Mas e quando há uma impossibilidade em renovar o vínculo, como nos casos em que a criança é adotada por outra família? Observa-se que se houve uma separação entre o bebê e a família superior a seis meses ou quando as separações ocorreram repetidamente, há um estágio de desligamento avançado onde ele passa a viver uma espécie de luto, encorajado ainda pela falta de visita e pelo fenômeno da institucionalização, portanto recebendo cuidados de pessoas não ligadas a ele afetivamente (que não lhe oferecem ligação afetiva suficientemente segura, permanente).
O meio ambiente exerce influências muito significativas no desenvolvimento do bebê, tanto pode ser fonte de segurança como de insegurança, há muito no meio externo que possa angustiar um bebê, e a pessoa que exerce a função materna na vida do bebê é quem vai poder ajudá-lo a lidar com tais ameaças: “No desenvolvimento saudável normal, os perseguidores pertencentes ao novo fenômeno, o exterior, são neutralizados pela dedicação materna, que fisicamente (como no holding) e psicologicamente (como na compreensão ou empatia, que permitem a adaptação sensível) torna o isolamento primário do indivíduo um fato.” (Winnicott, 1952). Esse isolamento é um mecanismo do indivíduo usado, neste caso, em sua relação com o meio, e é uma condição para que seja recuperado o self, o “eu”, para que haja discriminação entre o meio externo e o meio interno.
Crianças que sofreram algum tipo de perda ou separação tendem a apresentar ansiedade devido ao temor de que isso possa se repetir em suas vidas; a ansiedade decorre do medo, produto da percepção da possibilidade de aproximação de situações geradoras de dor e perigo.
A ansiedade especificamente relacionada à separação tem uma repercussão significativa na autoestima, no desenvolvimento da autoconfiança e da confiança no outro, o que pode comprometer o desenvolvimento da independência e da autonomia. Também neste caso, a vinculação e o apoio de figuras parentais vão favorecer um desenvolvimento mais saudável pela capacidade de contenção dos mesmos.

Referências Bibliográficas:
Bowlby, John – “Formação e rompimento dos laços afetivos” – São Paulo: Ed Martins Fontes, 1997.







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