sexta-feira, 30 de setembro de 2011

Sono e Choro - Cama compartilhada






Artigo na íntegra de Elena de Regoyos e extraído do blog MamaÉ Doula 








O sono dos nossos filhos é sempre um assunto interessante. As mães vivemos cansadas, dormimos mal e queremos soluções. "Não tem corpo que agüente", falamos, com razão... Mas pensemos em por que eles dormem como dormem, e o que podemos fazer para mudar isso.

Eu trouxe aqui um resumo-tradução próprios do exposto pela psicóloga espanholaRosa Jové, especializada em sono infantil e autora de muitos livros, entre eles“Dormir sin lágrimas”, que surgiu como resposta ao supervendas “Duérmete niño”; de Eduard Estivill, equivalente à versão brasileira “Nana neném”. Ambos dois (“Duérmete niño” e “Nana neném”) explicam como podemos “ensinar” a dormir os nossos filhos, deixando-os chorar e pautando horários.

Dormir é tão importante quando comer ou respirar, por isso nascemos sabendo fazê-lo. O detalhe é que as fases de sono de um recém nascido são bem diferentes dos de um adulto. Isso é um problema? Objetivamente não, é natural. Mas para os adultos, claro, esse desfase vira um problema.

Vamos conhecer, entao, as fases de sono dos bebês, e a sua evolução segundo sua idade:

O sono do bebê dos 0 aos 3 meses



Um recém nascido precisa comer freqüentemente para evitar hipoglicemias (descensos no seu nível de açúcar em sangue). Por esse motivo, eles não podem ter um sono muito continuo, pois assim eles garantem uma ingestão de alimento freqüente, além de manter a produção do leite necessário no seio da sua mãe. Isso inclui a noite.

O sono nestes primeiros meses é bifásico: tem só duas fases (sono ativo ou REM e sono lento), de uma duração aproximada de 50-60 minutos, tempo que demora em acordar de novo. Aos poucos, ele vai emendando uma fase com a outra, dormindo mais de forma seguida, mas no começo não é assim. Ele acorda também para estimular sua mente e conhecer o entorno (esta em pleno processo de desenvolvimento), mas também se cansa rápido, então dorme de novo.

É um sono, também, ultradiano: não diferença dia e noite (assim assegura o alimento noturno também). É poliseqüêncial, o que quer dizer que se reparte em várias seqüências ao longo do dia, ao contrário dos adultos, que tem um sono uniseqüêncial (só dorme de noite) ou até biseqüêncial (de noite e alguma siesta).

Os bebês têm uma maior porcentagem de sono REM que um adulto. Isso garante que ele integre os aprendizados do dia, ajudando a desenvolver sua mente enquanto dorme. Além disso, eles iniciam o sono diretamente em fase REM, sem passar por outras fases de sono lento. O sono profundo ou lento ajuda à recuperação física da pessoa, enquanto que o sono REM ajuda à recuperação mental. Os bebês não têm desgaste físico, mas sim tem muito desgaste mental, porque estão permanentemente recebendo estímulos novos, que precisam assimilar.

Então, o sono de um recém nascido está perfeitamente adequado as suas necessidades. É cansado atender um bebê durante a noite, mas uma vez sabemos o importante que é para ele dormir (e acordar) desse jeito, talvez seja mais fácil para nós aceitá-lo e compreendê-lo.

Durante a noite, o leite materno segrega um hormônio chamado L-Triptófano, que ajuda a ela e ao bebê a pegar no sono de novo. Só permanece no corpo de ambos uns minutos após a mamada. Nenhum leite artificial contém este hormônio.



O sono do bebê de 4 a 7 meses

A criança muda mais em estes primeiros 6 meses de vida do que mudara na vida inteira. E o sono dele também. Agora o sono dele será mais predecível, e começara dormir mais durante a noite que durante o dia. Se o bebê estava dormindo melhor, talvez agora comece acordar mais durante as noites. Isto, pese a poder parecer um retrocesso, é um avanço. Ao redor dos dois meses de idade, começam surgir no bebê nas fases III e IV de sono, nas quais é mais difícil acordar ele. Mas com 3 meses, surgem as fases I e II, de sono mais ligeiro. Portanto, agora o seu sono é:

-Circadiano: diferencia o dia da noite. No final desta etapa ele dorme geralmente a noite (acordando varias vezes) e duas vezes durante o dia. Também reduz suas horas de sono.

-Polifásico: Agora não só já adquiriu todas as fases de um sono adulto (com as suas 5 fases), senão que às vezes é capaz de ementar um ciclo com outro, dormindo mais horas seguidas, só que com mais micro despertares entre um ciclo e o outro. Os adultos também têm micro despertares entre um ciclo e outro, só que já estamos acostumados, então é esse momento no qual damos uma viradinha na cama, nos cobrimos... E continuamos dormindo. Os bebês ainda têm que se acostumar com isso, e geralmente precisam de ajuda para voltar ao sono, seja mamando, sentindo a sua mãe ou pai perto, o com alguém acariciando suas costas.


Em apenas três meses eles integram muitas fases novas de sono (duas delas de sono ligeiro), e tem que ir se acostumando a elas. É um período de freqüentes despertares. O fato de que os pais não consigam dormir bem, não significa um problema da criança, não acontece nada errado com ela. Tudo esta indo segundo o esperado, se respeitamos suas fases de desenvolvimento.

O sono da criança dos 8 meses aos 2 anos


O sono de uma criança não é igual ao de um adulto até quase os 6 anos. Mas a partir dos 8 meses o bebê paro de “construir”, e agora só vai “madurecer”. O sono, então, a partir dos 8 meses, e até os 2 anos será:

-Temido: a angustia da separação se manifesta também durante a noite. Ele começa perceber que tem um período do dia, quando ele vai dormir, em que se separa dos seus pais. Pelo tanto, é um grande alivio para eles dormirem a noite toda acompanhados, ou pelo menos acompanhar eles até eles ficarem dormidos.

A maioria dos “especialistas” que aconselham não acompanhar a criança para dormir, porque senão “eles podem se acostumar para sempre”, aconselham também colocar um bonequinho de pelúcia na cama... E se eles se acostumam para toda a vida? Não costuma acontecer, Né? Eu acredito que, do mesmo jeito, nenhum adolescente em circunstâncias normais vai pedir para seus pais dormirem com ele, nem gostaria da idéia se eles insistissem em fazê-lo. Já pensaram? Em qualquer caso, não conheço nenhum adulto que precise da companhia dos seus pais para dormir, e alguns deles sim precisam do seu bonequinho “de estimação”. Curioso.

-Curioso: O fato de começar engatinhar e/ou caminhar também gera ansiedade em ele, que vê que pode se afastar da sua mãe por conta própria. Durante a fase REM, as coisas que nos preocupam se assimilam, mas as vezes provocando pesadelos. Então o fato deles acordarem à noite é ainda habitual, por muito que tantos e tantos pais presumam do fato do filho dele “dormir a noite toda desde os “x” meses”.

O sono da criança dos 3 aos 6 anos


Muitas das crianças de esta idade já dormem a noite toda, mas não quer dizer que não seja normal que elas ainda acordem habitualmente, já que até os 5 anos é perfeitamente normal que isso possa acontecer.

“Queremos que as crianças durmam como os adultos... mas para poder dormir como um adulto, é preciso ser um adulto!!” (Explica Rosa Jové. E, como com isso, com tudo).

E é importante lembrar que adultos também gostamos de dormir acompanhados...

O que não se deve fazer

Para começar, não se deve fazer do normal, um problema. Que o sono de um bebê incomode aos adultos não quer dizer que há um problema, nem, por tanto, nada que deva ser corrigido. Os bebês dormem como dormem porque é o adequado para seu desenvolvimento. O problema está no adulto, coitado, que não rende no dia seguinte, que vive cansado. Mas o seu filho não tem problema nenhum.

Estatísticas

Sabem quantas crianças de 7 meses dormem 10 horas seguidas, sem interrupções? Apenas um 10 ou 15%. Tem alguns que o fazem, mas isso não quer dizer que seja o normal. Aos 14 meses, o maior problema de consulta pediátrica é que as crianças acordam à noite. Em um estúdio de Anders (1979), somente o 33% das crianças de 9 meses dormiam 5 horas seguidas durante a noite. E só o 18,7% das crianças de um ano dorme a noite toda.

Nas sociedades e culturas onde as necessidades das crianças são mais respeitadas, não se registram problemas de sono infantil. Isto não é porque essas crianças não acordem de noite, senão porque para essas sociedades isso não representa um problema, pelo tanto não pó reportam como tal, já que podem dormir durante o dia. No ritmo da nossa sociedade ocidental, surge o problema, porque não podemos recuperar sono durante o dia.

Agora pensemos nos métodos de adestramento infantil, para “ensinar as crianças a dormir a noite toda”. Olhemos essas dicas como se, em lugar de estar falando de um bebê, falassem de um adulto. Permitiríamos um trato assim? Todos somos pessoas, desde o momento em que nascemos (ou até antes), pelo tanto devemos ter os mesmos direitos. Antes de aplicar qualquer “método” no seu filho, pense se você aplicaria esse mesmo método, essas mesmas negativas ao reclamo de atenção e necessidade de companhia e carinho, no seu marido, mulher ou avô.

Os adultos caem em “erros” tais como o bloqueio da sua memória infantil, o “adultismo” ou até o narcisismo. Desse jeito, para evitar sofrer com dores do passado, viram insensíveis as necessidades infantis. Ou pensa que as suas necessidades são mais importantes que as da criança falando coisas como “que agüente um pouco, eu também tenho direito a descansar!”. E, no ultimo caso citado, com pais muito perfeccionistas que consideram que um filho que não dorme a noite toda ou “se comporta mal” (segundo seus cânones) são vividos como erros próprios, inadmissíveis, pelo que tentarão passar a culpa à criança.

São erros, também, pensar que a necessidade de afeto e contato das crianças existem só de dia, e de noite é capricho só. O decidir que é o adulto quem estabelece como seu filho tem que dormir e, muito habitual pensar que todo o que a criança faz “é para manipular” aos pais. As crianças pedem o que necessitam, e utilizam o que tem ao seu alcance para nos fazer chegar a mensagem.

A saúde dos nossos filhos, em risco




Pois bem, quando deixamos chorar a uma pessoa, mais ainda um bebê ou criança (com toda nossa “boa intenção”; para “ajudá-la e ensiná-la a dormir”), entra em funcionamento na sua cabeça um dos sistemas mais antigos de alarme cerebral: o sistema HHA (hipotálamo-hipofisio-adrenal). Uma criança sozinha em um quarto escuro se sente ameaçada, desprotegida, pelo tanto, instintivamente em risco.

Quando nosso corpo se sente ameaçado e prepara para o pior, ou seja, fugir ou brigar. Com esse fim, nossa amígdala (parte do cérebro emocional) ativa a descarga de adrenalina e outros hormônios para provocar uma ativação geral do organismo (ótimo para antecipar a hora de dormir... –comentário irônico-). É como se você estivesse no quarto, para dormir, no escuro, tranqüilo... e de pronto escuta um barulho no corredor da sua casa, inesperado. Não ficara desvelado com os olhos abertos em alerta? Essa é a ativação do sistema HHA.

Esse fluxo hormonal invade o cérebro da criança, colapsando a amígdala. As crianças choram sem descanso até colapsar a amígdala. Como a natureza é sabia e o corpo não resistiria muito tempo em estado de shock assim, libera sustâncias de caráter opiáceo, como endorfinas e serotonina, que provocam uma decida no sistema de alarme do indivíduo. Daí que o normal é que, trás um tempo chorando (as vezes minutos, outras horas), o menino cai rendido, e dorme. Não se engane. Não é que o método para ele dormir seja eficiente, é que ele se autodrogou para não colapsar seu cérebro.

Por isso funciona melhor com crianças mais novas, porque quanto mais pequeno ele é, ele mais fácil se assusta.

Após sucessivas experiências assim, a criança aprende que ninguém vai atendê-la, que as suas necessidades não merecem atenção (baixa autoestima), e por isso muitos deles deixam de reclamar.

Aumenta o nível de cortisol, o hormônio do stress. Com a ativação excessiva e continuada se mantém altos níveis de cortisol, que podem ter um efeito tóxico cerebral, provocando perda neuronal e vômitos involuntários. Bom, é bom falar dos vômitos, pois alguns “expertos treinadores de crianças” dizem (de novo enfoque manipulador das crianças) que elas“podem até provocar seu vômito para chamar nossa atenção e fazer com que vamos atendê-las”.

Em segundo lugar, o fato de repetir esta liberação de hormônios excitantes em situações de estréss para a criança, produz uma redução na produçao normal de serotonina, e a sua amígdala fica dessensibilizada para sempre, ficando alterada e fazendo a criança perder oportunidades de desenvolver a confiança, a autoestima e a empatia. Os baixos níveis de serotonina são indicadores de maiores níveis de violência em humanos, e esta relacionada com maiores tasas de suicídios, desordens anti-sociais e outras condutas agressivas.

A criança, com estes métodos, conseguirá dormir sozinha e sem reclamar, mas não pense que ele aprendeu a dormir, senão a se submeter.


Seqüelas e efeitos negativos



O Psico historiador Lloyd de Mause explica que os traumas provocados pelo desamparo podem magoar severamente o hipocampo, matando neurônios e ativando uma desregulação duradoura da bioquímica cerebral. Entre as seqüelas mais importantes, que podem ser observadas em crianças, estão a ansiedade, depressão, indefensão apreendida, síndrome de estréss pós-traumático, transtornos do apego e alterações de comportamento tais como hiperatividade”.

A possibilidade de trauma é maior quando é outro indivíduo quem o provocou. As crianças têm um fator pior, pois são as mesmas figuras paternas que os submetem a isso, precisamente de quem elas esperam proteção e consolo. Como uma criança pode entender isso?

Como melhorar as noites?


Como recomendações para melhorar as noites, além de conhecer, compreender e acompanhar o desenvolvimento do sono nas crianças, ressaltam dois: aleitamento e “coleito” (dividir leito com bebê) ou cama compartilhada.


Do aleitamento já temos falado e falarei mais em outras ocasioes.

Enquanto à importância nas qualidades positivas do “coleito”, é importante pensar na comodidade de não ter que passar a noite toda deitando e levantando, caminhando pela casa até o quarto do bebê, amamentando ele sentada na poltrona, etc. Ele acorda, esta com você, amamenta ele, os dois dormem enquanto mama, ou depois disso. Também ajuda o bebê a sincronizar as fases de sono com as da mãe dele.



Sem falar da necessidade de contato permanente de uma cria mamífera com sua mãe. Já viu uma cadela com os seus filhotes? Uma gata? Uma coelha? Imagina as crias dormindo longe dela? Não seria um choro permanente reclamando a presença da mãe? Sem ir mais longe... Como dormia sua bisavô com seus filhos? Como dormem nas tribos? Isso de se separar das crias à hora de dormir é um invento moderno... Não é em absoluto natural, nem muito menos recomendável, pelo menos desde o ponto de vista do bebê.

Para coleitar de uma forma segura é preciso que nenhum dos pais seja obeso, nem fumante nem tenha bebido álcool. É recomendável escolher um colchão duro e dormir sem agasalhar demais o bebê, pois o calor do corpo a corpo com os pais é suficiente. E retire travesseiros, lençóis ou edredons que possam afogar o bebê durante a noite.


* o complemento é meu

sexta-feira, 23 de setembro de 2011

Reflexões sobre o Acolhimento de Crianças e Jovens

“Casa é o lugar onde mora o coração” 


Como nos diz Pedro Strecht, a vida nem sempre é justa. As crianças não nascem iguais em direitos. Mas não podemos desistir de contrariar uma certa ordem das coisas, bater à porta dos corações e perguntar sem medo: pode-se entrar? Indignar-nos sempre que for preciso e lutar.
É isto que todas as pessoas que trabalham na área das crianças e jovens em risco, especificamente em instituições de acolhimento, fazem: lutar!
Lutar por (re) avivar a esperança no coração de cada criança, jovem ou adulto que acompanhamos...Porque a vida nem sempre é justa, porque os pais nem sempre são progenitores, porque os caminhos nem sempre são lineares....
A instituição, ou com prefiro chamar-lhe a “Casa de Acolhimento”, deve levar a cabo um conjunto de projectos e actividades com o objectivo de dar resposta às necessidades, promover o desenvolvimento pessoal, social, educacional e afectivo das crianças e jovens, permitindo a promoção de competências, o aumento da auto-estima e a segurança de ser amado pelo que se é, visando também possibilitar-lhes experiências positivas no presente, para que possam ter uma perspectiva de futuro; acreditar em si mesmas, para poder acreditar no “amanhã”...
Sabemos que o que deve estar sempre subjacente ao acolhimento são os afectos, “ O que temos entre mãos não é um caso nem um processo, é simples mas tão complexamente a vida de uma criança.
As crianças e os jovens acolhidas chegam-nos cheias de feridas e marcas, são vítimas de vicissitudes e circunstâncias geradoras de mal-estar, de ausências de afecto, de desinvestimento, de vazios internos e externos, estando ávidos de amor, ávidos de organização, ávidos de um lar onde habitar e pousar o seu cansaço porque, como nos diz Mia Couto “A casa é o lugar onde mora o coração”.
Nogueira (2005) considera que por se tratar de uma “casa” e pelo facto de que muitas crianças e jovens trazerem na sua bagagem uma história de vida marcada por experiências traumáticas, a preocupação e a responsabilidade com a qualidade da intervenção e da qualificação do acolhimento institucional deve ganhar uma proporção ainda maior. Assim, é necessário que os cuidadores, os responsáveis pelas crianças e jovens acolhidos, voltem os seus sentidos em direcção a eles, a fim de que possam compreender os seus gostos, interesses, capacidades e dificuldades como características pessoais que estruturam a sua personalidade e orientam o seu comportamento.
A Casa de acolhimento deve sempre intervir com base no respeito e numa efectiva valorização das suas crianças e jovens, uma vez que lhes deve ser proporcionado o afecto essencial para o desenvolvimento de uma boa auto-estima e de uma vinculação segura, assente numa boa estruturação psicológica e afectiva.
O nosso trabalho deve basear-se em Afectos e as equipas (técnicas e educativas), os educadores, os modelos destas crianças e jovens, devem constituir-se como figuras securizantes, disponíveis internamente para dar, estar, comunicar e comungar...
Em definitivo, não há uma receita ou um manual rígido de como bem proceder como uma criança e/ou jovem. Cada um deles tem uma história e emoções muito próprias, uma personalidade própria, sonhos muito próprios, muito seus. Por isso não deve haver receitas mas sim flexibilidade e criatividade.
No entanto, sabemos que a personalidade se desenvolve em sintonia com figuras contentoras e permanentes, modelos de referência que os ensinem e protejam no aqui e no agora, mas também que assegurem que esta protecção e amor esteja presente nas suas vidas SEMPRE e PARA SEMPRE. E, por isso, é importante ser céleres na definição do projecto de vida e, muitas vezes, radicais nas decisões que são tomadas, pois nem todos os pais são progenitores e porque as crianças não podem nem devem esperar eternamente  por mudanças que nunca chegam. Tal como nos diz Winnicott: "Sem ter alguém dedicado especificamente às suas necessidades, a criança não consegue estabelecer uma relação eficiente com o mundo externo. Sem alguém para dar-lhe gratificações instintivas e satisfatórias, o bebé não consegue descobrir seu próprio corpo nem desenvolver uma personalidade integrada". ,
 Partimos assim do princípio que a protecção das nossas crianças e jovens terá sempre de assentar em dois vectores: tempo e afectos. Em primeiro lugar, o tempo, que para as crianças e jovens acolhidos, não é, nem pode ser uma dimensão linear nem objectiva. O tempo tem de ser visto antes como uma dimensão relacional, sendo uma condição essencial na intervenção com crianças, uma vez que dele depende também o desenvolvimento e o evitamento de feridas profundas e vazios irreparáveis. Não podemos congelar o desenvolvimento psicológico de uma criança que precisa a cada segundo de ser amada e protegida para poder percepcionar o seu valor e a sua segurança, evitando o sentimento de desamparo e de não ser querida…
Em segundo lugar, os afectos, pois é nossa convicção, ao trabalhar com crianças e jovens que “não pertencer a ninguém é correr o risco de tornar-se ninguém”, daqui que os afectos sejam factores essenciais e vitais no desenvolvimento psicológico de qualquer ser humano, precisamos de pertencer para poder Ser…
Por isso as crianças e os jovens que são acolhidas precisam urgentemente de uma definição do seu futuro, e de pais ou modelos de referência que assegurem o seu desenvolvimento, sobretudo psicológico e emocional, pois, muitos deles são aquilo a que se chama de "maravilha ferida", ou seja, crianças e jovens, que apesar de todo o sofrimento, de toda a agressividade e das marcas do abandono e desamparo a que sempre estiveram sujeitas, são muito bonitos: vivos, espontâneos, sensatos, e intuitivos, valorizando aquilo que vale a pena valorizarem na vida: as pessoas, a esperança, e o futuro.
 Pode ser lugar comum, mas parece-me que no nosso dia-a-dia com eles,  devemos ser autênticos e estar completamente conscientes das nossas responsabilidades enquanto educadores, contentores, protectores das nossas crianças e jovens. Devemos estar atentos aos seus sinais, às suas estratégias tantas vezes mais eficazes do que aquelas que pensamos ser as “certas”, devemos ser verdadeiros ouvintes para compreender verdadeiramente e ser co-construtores de histórias para que a história das suas vidas se possa transformar. Que cada momento com cada criança, jovem ou adultos em dificuldades, em perigo ou em risco, seja uma oportunidade para entender os seus SOS, que por vezes apenas querem dizer “SE ME OUVIRES SALVAS-ME”.
Estas crianças e jovens, tantas vezes magoados e defraudados por aqueles que lhes deveriam assegurar tudo, o amor, os sonhos, a certeza de ser querido exactamente como são e pelo que são, têm o direito a ser amados, a confiar que não serão jamais abandonados. Estas crianças e jovens têm direito “a ter um colo onde se possam sentar, enroscar como numa concha e receber mimos, a acreditar que um adulto olha por eles e os ama sem condição prévia, a ter alegria suficiente para imaginar coisas boas antes de dormir e depois, a sonhar com elas,  “têm o direito de não ficar sozinhos a chorar, têm direito a crescer felizes e a ter paz nos seus pensamentos e sentimentos”. Pedro Strecht; 1998 (in Crescer Vazio)
Sobretudo, temos como missão cuidar mas também dar um sopro de vida e estas crianças e jovens, fazer renascer a Esperança em si mesmo e no futuro, fazê-los acreditar nas pessoas, sem medo de ser abandonados ou desiludidos, quebrando ciclos de desânimo aprendido e dissipando o medo de perder. Em suma, através da relação, que deve ser sempre terapêutica e autentica, temos obrigação de ajudá-los e ensiná-los a estar vivos, pois Estar vivo não supõe, só, um coração que bate (…).Estar vivo, num plano psíquico, exige, também, um conjunto de relações significativas que nos dão vida, pela diversidade das solicitações, pelas contradições que aclaram em nós, e pelas formas como nos movem e nos fazem crescer”Eduardo Sá, in Adolescentes somos nós.